Foto: Silvia Medeiros

Natural do Rio Grande do Sul, Delfina Meotti Araldi e seu esposo, Ilton Francisco Minusculi Araldi, vieram ainda jovens morar em Santa Catarina. Hoje, mora na comunidade da Encruzilhada em São Domingos, oeste catarinense, e é mãe de quatro filhos: três mulheres e um homem. 

Dona Delfina divide as tarefas com a sócia, a filha, Juçara Meotti Araldi, de 45 anos. Enquanto a mãe alimenta os animais e o separo do leite, a filha é responsável pelas ordenhadeiras e troca das vacas que já passaram pelo processo de ordenha. Aos olhos de quem não conheceu o processo manual de retirada de leite antes da tecnologia das ordenhas, tudo ainda parece muito difícil e pesado. Mas para Delfina, agora é que são tempos mais fáceis. Juçara mostra as suas mãos e comenta o desconforto frequente que sente no músculo da palma, uma dor sem cura, ocasionada pelo movimento repetitivo da ordenha.

A aposentada segue tratando dos animais, entra e sai do cômodo em que fica as rações com um carrinho de mão. Agrada alguns bichos, os chama pelo nome, conhece cada uma das vacas, apesarem de serem mais de 40. Depois de tirarem 500 litros de leite, o trabalho da manhã chega ao fim. É hora de passar a missão para os homens da casa, Ilton e seu filho Tiago, que já estão de pé e levam os animais para o pasto.

É segunda-feira, dia em que Delfina vai para a cidade fazer pilates, um exercício físico de alongamento que garante que a senhora de 67 anos ainda tenha tanta disposição para as tarefas do dia a dia. São algumas horas fora de casa e já tem que retornar em tempo de fazer almoço para a família. Depois que todos almoçam e repousam, Delfina segue para mais uma de suas tarefas: a produção de queijo, nata e manteiga para vender na feira.

Caprichosa, ela conta como seus produtos fazem sucesso na cidade. Mas apesar da boa fama de seus queijos, o filho Tiago comenta. “A mãe já trabalhou muito, ela precisa de um tempo para descansar. Eu já falei pra ela que não quero que ela pegue muitos pedidos pra fazer”. Delfina concorda com o filho, só que não sabe dizer ‘não’ para os seus fiéis clientes. “Foi com a venda dos queijos, natas e manteigas que eu consegui pagar a faculdade da Jucélia”, fala orgulhosa sobre a filha do meio que se formou em Pedagogia.

A casa de Delfina é uma residência típica de casas do interior. A parte externa é cercada por flores e uma horta que ela se queixa que está tomada de mato e não tem tempo para roçar. Dentro, apesar de simples, a casa possui todas as tecnologias de uma casa da cidade. Tem micro-ondas, forno elétrico, liquidificador, um cilindro elétrico de passar os pães, freezer, geladeira e móveis bem conservados. Tudo foi adquirido com o dinheiro da sua aposentadoria.

Aposentada há 12 anos, ela lembra dos tempos difíceis que já passaram. Sem ter com quem deixar os quatro filhos, quando trabalhavam, ela e o esposo no plantio de soja e fumo, dona Delfina levava todos para a roça.

“A gente ganhava só pra manter a produção. Não tinha dinheiro pra comprar roupa ou calçado. As compras do mercado a gente deixava pendurado, quando dava um valor que a gente não tinha como pagar, nós oferecíamos um boi pra quitar a dívida”. Hoje Delfina diz que é bem diferente, embora passem por dificuldades, ela consegue manter as despesas do mercado, enquanto o dinheiro da roça e do leite, que são administrados pelo seu filho, é reservado para as contas maiores, como financiamentos, despesas de luz, carros e gastos com a produção.

A filha caçula, Jucimara Meotti Araldi, fala da diferença que percebeu quando sua mãe passou a ter seu próprio dinheiro. “A mãe comprou a sua primeira bolsa aos 55 anos, depois que teve acesso à aposentadoria. Hoje ela tem celular, paga os seus remédios, compra suas roupas e ainda sobra um dinheirinho pra ela comprar presentes para os netos”.

Delfina administra bem o dinheiro. Além de todas essas despesas, ela deixa uma reserva no banco, através de uma aplicação financeira, pois como ela diz “a gente não sabe o dia de amanhã”. Ativa, foi com o dinheiro da aposentadoria que ela pagou a sua carteira de motorista e se orgulha de não depender de ninguém para levá-la as reuniões e compromissos da igreja e da cooperativa, da qual ela integra a diretoria.

Delfina está preocupada com a reforma da previdência, apesar de já ter a sua aposentadoria garantida. Ela é filiada ao sindicato dos trabalhadores na agricultura familiar de São Domingos e tem participado de debates que falam sobre a mudança das regras da aposentadoria. “Não sei de onde as mulheres terão saúde para se manter na roça. Vai sobrar pouco tempo de vida usufruírem da sua aposentadoria. Se aumentarem mais ainda a nossa idade para se aposentar, vão gastar mais com remédio e médico do que com elas mesmas”.

 

LEIA TAMBÉM:

 DIAS MELHORES PARA LORECI |

 UMA VIDA DEDICADA ÀS LUTAS DAS CAMPESINAS |

LÍDIA SUSTENTA A CASA |