Assédio no trabalho: denúncia rompe ciclo do abuso
O assédio moral e sexual no ambiente de trabalho é uma prática recorrente que afeta a maioria das mulheres, seja direta ou indiretamente.
Nosso grupo escolheu o assunto assédio no trabalho, pois é algo que consideramos pouco discutido. O assédio no ambiente de trabalho é uma realidade que afeta muitas mulheres, sendo um problema que frequentemente passa despercebido ou não é tratado com a seriedade que merece.
Para além de ser um tema relevante por si só, é especialmente importante porque muitas vítimas se sentem impotentes para denunciar, na maioria das vezes devido à estrutura hierárquica das empresas. A posição de quem sofre o assédio muitas vezes leva ao silêncio ou à sensação de impossibilidade de tomar qualquer ação, como denunciante.
Nesta matéria, destacamos a realidade de quem sofre esse tipo de abuso, mostrando como é possível buscar ajuda e denunciá-lo. Apresentamos a entrevista que fizemos com uma jovem de 17 anos, que preferiu manter o anonimato.
Ela trabalhou em uma instituição bancária e sofreu repetidos episódios de assédio moral e sexual. Seu relato expõe como a dinâmica do poder pode transformar o local de trabalho em um ambiente opressor: “Infelizmente já. Algumas vezes ele me esperava nas escadas e tentava me abraçar, me chamava para jantar, mesmo deixando claro que não tinha interesse”, contou a jovem.
Problema sistêmico e silenciado
O assédio moral e sexual no ambiente de trabalho, infelizmente, é uma prática recorrente que afeta a maioria das mulheres, seja direta ou indiretamente. Com base em relatos e fontes consultadas para essa matéria, fica evidente que o ambiente de trabalho, especialmente em setores majoritariamente masculinos, se torna um espaço de desconforto e medo para as vítimas mulheres.
O poder hierárquico muitas vezes faz com que as vítimas não denunciem as agressões, temendo represálias ou até mesmo o descrédito por parte de superiores. Para entendimento apontamos que assédio moral é manifestado por toda conduta abusiva, incluindo gestos, palavras e atitudes.
De acordo com a Cartilha de prevenção e combate ao assédio moral e sexual no ambiente de trabalho, do Ministério das Comunicações, são comportamentos repetitivos que afetam a dignidade, autoestima, autodeterminação, desenvolvimento profissional e integridade psíquica ou física de um trabalhador.
Há ainda o assédio sexual que é definido, de forma geral, segundo informa a cartilha, como o “constrangimento com conotação sexual no ambiente de trabalho, em que, como regra, o agente utiliza sua posição hierárquica superior ou sua influência para obter o que deseja”.
Impacto psicológico e a busca por soluções
Quando questionada sobre o impacto emocional dessas experiências, a jovem relatou que, ao lembrar dos acontecimentos, ainda sente medo e apreensão.
“Na época, não queria acreditar no que estava acontecendo. Achava que era coisa da minha cabeça e que ele pararia”.
Esse sentimento de dúvida e descrença sobre o que está acontecendo é comum entre vítimas de assédio, que muitas vezes internalizam a culpa e se questionam sobre a veracidade das próprias percepções.
Apesar disso, a empresa onde ela trabalhava agiu rapidamente ao ser informada do caso. Segundo a entrevistada, após o primeiro relato confirmado, o agressor foi desligado imediatamente. Este caso, no entanto, é uma exceção. Muitas empresas ainda carecem de procedimentos claros e eficazes para lidar com essas situações, e muitas mulheres, como a jovem, demoram a buscar ajuda, por medo de não serem ouvidas.
Como denunciar e buscar ajuda
A reportagem também busca informar e empoderar mulheres sobre como podem denunciar essas práticas abusivas. É importante que as vítimas saibam que existem canais para relatar assédios, tanto internamente, em suas empresas, quanto externamente, através de órgãos de proteção aos direitos trabalhistas e institutos de defesa das mulheres. A denúncia, embora difícil, é um passo crucial para romper com o ciclo de abuso.
No caso da jovem entrevistada, ela admite que inicialmente não fez uma denúncia formal por acreditar que nada seria feito.
“Na época, achava que nada ia mudar, mas depois que outras denúncias surgiram, me senti mais segura para falar. Quando mais vítimas apareceram, o RH agiu e o agressor foi demitido.”
A reportagem se destina principalmente às mulheres inseridas no mercado de trabalho, mostrando que, apesar das barreiras, é possível denunciar, e que existem mecanismos e instituições preparadas para acolher e investigar esses casos. A jovem entrevistada deixou uma mensagem clara:
“Eu espero que, com meu relato, outras mulheres que passaram ou estão passando por isso não se sintam sozinhas e busquem ajuda”.
Reforçamos que o assédio no ambiente de trabalho é uma violação dos direitos humanos, mas pode ser combatido com políticas firmes de proteção, canais de denúncia eficazes e uma conscientização cada vez maior de toda a sociedade. É crucial que as vítimas se sintam seguras para denunciar e que as empresas ajam de maneira firme para punir os agressores. Assim, o ambiente de trabalho pode se transformar em um espaço de respeito e equidade, livre de abusos.
Confira a entrevista na íntegra
Como você se sente no seu ambiente de trabalho?
Atualmente bem. Sempre tem algumas situações desconfortáveis principalmente porque tem muitos idosos na empresa e eles conversam bastante ou nos falam sobre como deveríamos nos vestir ou se comportar. Mas meu setor é composto em sua maioria por mulheres, então sempre estamos juntas e conversando sobre essas situações e o que fazer.
Você já sofreu o assédio? Como foram as situações?
Infelizmente já. Algumas vezes ele me esperava nas escadas e tentava me abraçar e me chamar para jantar ou beber, sempre deixei muito claro que não estava interessada ou falava que tenho namorado para tentar sair de perto. Já fui seguida na saída do trabalho até um pouco antes do ponto de ônibus. Algumas vezes ele ficava parado me observando de longe pelos corredores da empresa.
Como você se sente quando lembra do acontecido?
Apavorada. Lembro que na época não queria acreditar no que estava acontecendo, achava que era loucura da minha cabeça e que em algum momento ele se tocaria e pararia
Qual foi a sua reação quando aconteceu o assédio?
Algumas vezes pedia para trocarem de funções comigo para não precisar passar no andar dele ou quando o via nas escadas entrava no primeiro andar que via e esperava um tempo torcendo que ele fosse embora. Quando havia mais pessoas perto de mim, eu puxava conversas aleatórias para poder escapar dele ou andava sempre com alguma colega.
Você se sente segura no seu ambiente de trabalho?
Sim, pois assim que essa situação foi comunicada a diretoria juntou o pessoal dos Recursos Humanos e começaram uma investigação rápida. Assim que o primeiro caso foi confirmado, o funcionário em questão foi desligado imediatamente.
Você já buscou ajuda, denunciou o assédio à polícia?
Na época acreditava que nada seria feito então não cheguei a ir atrás de fazer a denúncia, mas com o tempo mais casos desse mesmo funcionário começaram a aparecer e não demorou até que uma delas denunciasse. Depois disso, eu e mais algumas nos mostramos dispostas a denunciar também caso necessário, mas logo o funcionário foi desligado.