Hebe de Bonafini: a mãe que desafiou a ditadura argentina

Por Daniela Valenga

Hebe de Bonafini, líder das Mães da Praça de Maio, organização que desde 1977 denuncia os desaparecimentos de opositores durante a Ditadura Militar na Argentina, morreu em 20 de novembro.

A Ditadura Militar ocorreu entre 1976 e 1983 na Argentina. Organizações de direitos humanos estimam que há entre 20 mil e 30 mil pessoas desaparecidas por consequência do período.

Hebe teve dois filhos e uma nora desaparecidos durante a ditadura e sua trajetória foi marcada pela luta e pelo ativismo em busca das vítimas.

Da classe média de Buenos Aires, Hebe se casou aos 14 anos. Dona de casa, cursou apenas a escola primária e teve três filhos: Jorge Omar, Raúl Alfredo e María Alejandra.

Jorge, professor de matemática, estudante de física na Universidade Nacional de La Plata (UNLP) e membro do Partido Comunista Marxista-Leninista, foi sequestrado aos 26 anos pelas forças de repressão.

Sua mãe passou a percorrer hospitais e delegacias e, em sua casa, começou a se reunir com outros familiares de pessoas desaparecidas.

Após o sequestro, Raúl, estudante de ciências naturais na UNLP e do partido comunista, passou a viver de modo clandestino. Aos 24 anos, desapareceu após uma reunião de sindicato, também em 1977.

Em 1978, sua nora e esposa de Jorge, María Elena Bugnone Cepeda, também desapareceu. Os três não foram encontrados até hoje.

Em 30 de abril de 1977, mães e parentes de desaparecidos se reuniram na Praça de Maio, centro de Buenos Aires. A polícia tentou dispersá-las dizendo que não se podiam realizar reuniões no local.

Para não ficarem paradas e serem reprimidas novamente, elas começaram a caminhar em pares, dando voltas no local, que fica em frente à Casa Rosada, sede da presidência argentina.

Foi assim que começou o grupo Mães da Praça de Maio. Até hoje, elas atuam como um grupo, caminham e usam lenços brancos na cabeça com os nomes dos filhos escritos.

A princípio ignoradas pelos grandes jornais argentinos durante a ditadura, elas buscaram a imprensa internacional para denunciar os desaparecimentos, tendo Hebe como uma das principais líderes.

Hebe ganhou vários prêmios internacionais em reconhecimento à luta realizada, como o Prêmio UNESCO de Educação pela Paz.

Hoje, as Mães da Praça de Maio são uma das entidades que lutam por direitos humano mais conhecidas internacionalmente e possuem um instituto universitário, um jornal, uma rádio e uma livraria.

Interrompida por dois anos durante a pandemia, a marcha tradicional das Mães ainda ocorre. Hebe participava das atividades do grupo quando possível pela sua saúde. Ela faleceu aos 93 anos.

"Me tornei Hebe de Bonafini no dia em que meu filho Jorge foi levado. Nesse dia saí para a rua e nunca mais voltei para minha casa como era antes."

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