Racismo recreativo: a normalização do racismo no campo e no palco

Por Kelly Ribeiro

Dois casos distintos de racismo têm levantado debates sobre apresentações de humor que reproduzem discurso de ódio, limites da liberdade de expressão e racismo no futebol. 

O jogador brasileiro Vini Jr., do Real Madrid, vem sendo alvo de casos sistemáticos de racismo em vários estádios e cidades da Espanha. O mais recente foi no dia 21 de maio, em jogo contra o Valencia.

O episódio extrapolou o mundo esportivo. A Ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, disse que os governos dos dois países acionaram o Ministério Público Espanhol para investigar La Liga. 

No Brasil, poucos dias antes, a Justiça havia determinado a retirada de um vídeo do Youtube em que o humorista Léo Lins faz piadas depreciativas sobre escravidão, PCDs e outros grupos.

Para pedir a suspensão, o Ministério Público se baseou na Lei nº 14.532/2023, que equipara o crime de injúria racial ao crime de racismo, sancionada pelo presidente Lula (PT), em janeiro deste ano. 

O curto intervalo entre os casos fez com que ambos fossem associados e analisados a partir do racismo recreativo, conceito criado pelo jurista Adilson José Moreira.

Moreira investiga no livro "Racismo Recreativo" as formas “aceitáveis” desse tipo de crime, proferidas em tom de piada ou em espaços de diversão, como os estádios de futebol. Ele afirma que:

“O uso do humor para produzir descontração está amplamente presente na atividade recreativa favorita dos brasileiros, embora as pessoas se recusem a interpretar esses atos como ofensas raciais.”

“Insultos racistas estão amplamente presentes nos campos de futebol e também em programas esportivos, sem que isso cause qualquer tipo de consternação.” 

Com exemplos de personagens estereotipados, a obra apresenta e discute a presença do racismo no humor através do uso subconsciente ou não da linguagem em seu modelo de manutenção do colonialismo.

Moreira lembra o caso de uma torcedora gremista flagrada por câmeras proferindo ofensas racistas ao goleiro Aranha, do time rival, durante partida pela Copa do Brasil, em 2014. 

Ela foi processada por injúria racial. Mas seus advogados afirmaram que ela não deveria ser responsabilizada por tal ato porque ela fez a mesma coisa que outros torcedores estavam fazendo.

Agora com a Lei sancionada em janeiro, ‘injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro, em razão de raça, cor, etnia ou procedência nacional” pode gerar pena de reclusão (2 a 5 anos) e multa.”

Em entrevista ao podcast Ubuntu Esporte Clube, a ministra Anielle Franco afirma que a pasta trabalha com o Ministério do Esporte para a construção de medidas de combate ao racismo no esporte.

Segundo ela, a expectativa é lançar no segundo semestre deste ano um programa nacional de combate ao racismo, elaborado a partir do grupo interministerial.

Seja no show de stand up ou na arquibancada de um campo de futebol, falas de cunho racista contribuem para a perpetuação de práticas de violência. Racismo recreativo é crime. 

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