Quem foi Eunice Paiva, que inspirou “Ainda Estou Aqui”

Por Daniela Valenga

“Ainda Estou Aqui” foi indicado em 3 categorias do Oscar 2025: Melhor Filme, Melhor Filme Estrangeiro e Melhor Atriz, com Fernanda Torres. O longa tem como protagonista uma brasileira que travou uma luta pelos direitos humanos.

Eunice Paiva nasceu em 1929 em São Paulo e cresceu no bairro do Brás. Brigou com o pai pelo direito de estudar e passou em primeiro lugar no vestibular para Letras, aos 18 anos.

Aos 23 anos, casou-se com o engenheiro Rubens Paiva, com quem teve cinco filhos: Marcelo Rubens Paiva, Vera Paiva, Maria Eliana Paiva, Ana Lúcia Paiva e Maria Beatriz Paiva.

Em 1962, Rubens tornou-se deputado federal por São Paulo pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB). Porém em 1964, com o Golpe Militar, seus direitos políticos foram cassados e ele se autoexilou.

Após 9 meses na Iugoslávia e na França, Rubens Paiva retornou ao Brasil. A família mudou-se para o Rio de Janeiro e ele voltou a exercer a engenharia, mantendo contato com os exilados brasileiros no exterior.

Em 20 de janeiro de 1971, Rubens foi preso por agentes da ditadura que foram até a casa da família. Eunice também foi presa, junto à filha Eliana, de 15 anos. 

Elas foram levadas até o Destacamento de Operações de Informações. Eliana permaneceu presa por 24 horas no local, Eunice por 12 dias, sendo interrogada.

Após ser solta, Eunice passou a exigir a verdade sobre o marido, além de assumir a responsabilidade dupla da criação dos filhos e da manutenção das finanças da família. A família retornou a São Paulo.

Documentos do Serviço Nacional de Inteligência (SNI) que vieram a público em 2013, mostram que ela e os filhos foram vigiados por agentes militares de 1971 até 1984.

Conforme narra o filho Marcelo, Eunice tinha 3 amigas inseparáveis em SP: Danda Prado, ativista lésbica, Lygia Fagundes Telles, escritora, e Renina Katz, ilustradora. “Madrugavam com uísque rindo do patriarcalismo”, conta.

Aos 47 anos, ingressou na faculdade de Direito e tornou-se especialista em direito indígena do país. Era uma das poucas profissionais que atuavam com demarcações.

Em 1983, assinou com Manuela Carneiro da Cunha, o artigo "Defendam os pataxós" na Folha de São Paulo, remontando o histórico do conflito fundiário. É considerado um marco na luta indígena brasileira.

Em 1987, ao lado de outros parceiros, fundou o Instituto de Antropologia e Meio Ambiente (IAMA), ONG que atuou até 2001 na defesa e autonomia dos povos indígenas

Como consultora na Assembleia Nacional Constituinte, que promulgou a Constituição Federal, sua contribuição é considerada fundamental para a formulação do artigo 231, sobre direitos indígenas.

Foi uma das principais forças de pressão para a criação da Lei 9.140/95, que reconhece como mortas as pessoas desaparecidas em razão de atividades políticas durante a ditadura militar.

Em 1996, após 25 anos de luta de Eunice por memória, verdade e justiça, o Estado brasileiro emitiu oficialmente o atestado de óbito de Rubens Paiva. O corpo nunca foi encontrado.

Eunice faleceu aos 86 anos, em 13 de dezembro de 2018, em São Paulo. Convivia há 14 anos com Alzheimer.

Em 8 de janeiro de 2025, a Advocacia-Geral da União criou o Prêmio Eunice de Paiva de Defesa da Democracia para homenagear aqueles que tenham colaborado para a preservação, restauração ou consolidação da democracia no Brasil.

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Imagens: STF e reprodução