Elza Soares: do planeta fome à eternidade 

Por Kelly Ribeiro

Divulgação de "My name is now, Elza Soares"

Elza Soares entrou para a eternidade. Despediu-se dos brasileiros no plano físico no dia 20 de janeiro de 2022 e passou a fazer parte da mítica popular a qual pertencem os maiores ícones culturais. 

Imagens: divulgação e reprodução

Nascida na favela da Vila Vintém, na Zona Oeste carioca, e criada em Água Santa, no subúrbio da Zona Norte, viveu desde cedo as mazelas que o país reserva a meninas pobres, pretas e faveladas. 

Filha de uma lavadeira e de um operário, desempenhou a mesma função dos pais. Casou-se obrigada aos 12 anos, virou mãe aos 13 e viúva aos 21. Perdeu quatro filhos: dois quando ainda era adolescente.

Garrinchinha, único filho que a cantora teve com o jogador, morreu aos 9 anos em um acidente de carro em 1986, e Gilson faleceu aos 59 anos, em 2015, por complicações de uma infecção urinária.

Começou na música ainda jovem, de forma quase instintiva. Elza dizia que descobriu que cantava enquanto carregava latas d’água na cabeça. No grunhido emitido após usar a força para levantar as latas.

Por volta dos 20 anos, fez seu primeiro teste como cantora, na academia do professor Joaquim Negli. Foi contratada para a Orquestra de Bailes Garan e seguiu no Teatro João Caetano.

Elza começou a se destacar na música como parte da cena do sambalanço com "Se Acaso Você Chegasse", em 1959.

Se fez rainha do samba, mas não ficou apenas no gênero que a consagrou. Nos 35 discos lançados explorou bossa negra, jazz, rock, música eletrônica, hip hop e funk.

O último disco lançado foi "Planeta Fome", em 2019. Uma alusão ao episódio em que foi constrangida por Ary Barroso no programa de calouros que participou nos anos 50. 

"De que planeta você vem, menina?", ele perguntou. E ela respondeu: "Do mesmo planeta que você, seu Ary. Eu venho do Planeta Fome."

Entrevista a Rogério Skylab

Em 2020, teve sua vida contada no samba-enredo da Mocidade Independente de Padre Miguel, agremiação do bairro onde fica a comunidade Vila Vintém. O título: “Elza Deusa Soares”. 

"A voz do milênio" não só cantou como também denunciou os problemas dos seus tempos. Ditadura, racismo, violência contra a mulher, contra a população LGBTQIA+. Dialogou com diversas agendas. 

Elza morreu de causas naturais em casa, aos 91 anos, no Rio de Janeiro. Partiu no dia do padroeiro da cidade e na mesma data em que quase quatro décadas antes morreu também, Mané Garrincha. 

Elza estava produzindo um novo álbum que pode ter lançamento póstumo.

Além de ter se apresentado em shows no Theatro Municipal de São Paulo que foram gravados para um DVD.

Elza cantou até o fim