Faz um ano da audiência pública que discutiu a ADPF 442 (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental) no Supremo Tribunal Federal (STF). A ação trata da descriminalização do aborto por livre decisão da mulher até a décima segunda semana de gestação. Ainda não há data para o julgamento.

Trazemos neste vídeo trechos da expositora Lívia Casseres, defensora pública do Rio de Janeiro, que abordou as relações entre o racismo estrutural e a criminalização do aborto no Brasil.

“Os dispositivos que criminalizam o aborto não apenas incidem sobre a raça como algo que lhe é externo, mas integram um conjunto de fenômenos ligados à estrutura social brasileira, em que raça e sistema penal se constituem mutuamente e determinam as vidas dignas de se proteger e aquelas que se pode deixar morrer.

Se os movimentos feministas mundialmente discutem a questão do aborto em termos de exercício dos direitos sexuais e reprodutivos, resultado da autonomia privada ou do direito ao próprio corpo, para as mulheres negras brasileiras expostas à morte na prática insegura do aborto, nem mesmo a ideia de maternidade compulsória seria adequada para retratar sua condição.

Alvo preferencial de esterilizações forçadas e de destituições abusivas do poder familiar, o corpo negro muitas vezes não é merecedor sequer dor e conhecimento do papel social subalterno e determinado de mãe.

Ao criar condições para a discriminação sistemática, a escolha legislativa por uma política penal para o aborto reforça os mecanismos que sujeitam mulheres negras a um regime político de subcidadania, e alimenta a continuidade do racismo, entendido como processo histórico e político.

[…] a Corte Suprema é chamada a afirmar a humanidade das mulheres brasileiras na sua mais radical concepção: o ponto de vista das mulheres negras.

[…]
Quando o Direito está a serviço de projetos de discriminação sistemática, como vimos ser o caso da criminalização do aborto, é preciso olhar debaixo da superfície, para identificar as implicações de regras aparentemente neutras […] que representam, em verdade, a perpetuação da situação de subordinação de grupos historicamente discriminados.”

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