Por Isa Maria Moreira Liz*.

Os meses que antecederam o golpe de 1964 foram palco de uma articulação política voltada à camada média da população brasileira. O discurso reacionário encontrou espaço nas organizações de mulheres da Igreja Católica, levando leigas e religiosas às ruas em defesa da ditadura. Um segundo movimento de mulheres, por outro lado, foi silenciado pela mídia da época: a atuação de freiras católicas em resistência à ditadura. A invisibilidade na ação política dessas religiosas não se deu por acaso, mas atendia às expectativas das funções sociais de uma mulher religiosa.

É aqui que entra em cena a subversão da normatividade de gênero. Freiras, missionárias e demais religiosas católicas, na dupla-identidade imposta de mulher e religiosa, souberam manipular os usos de gênero, orquestrando um movimento coletivo de resistência. A invisibilidade social da prática religiosa permitiu que atuassem como informantes, mensageiras, diretoras, educadoras, enfermeiras e coordenadoras de pastorais nas Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), debatendo pautas políticas nesses espaços. Hoje, essas mulheres são compreendidas como agentes políticas, sujeitos da própria história.

Enquanto isso, novamente passamos por uma conjuntura antidemocrática, que não é produto da pandemia da COVID-19, mas de um contexto político que vem há alguns anos preparando um novo golpe militar. Em contrapartida, se a cúpula da Igreja Católica apoiou o golpe de 1964, hoje, o posicionamento institucional católico é contrário à política necrofascista de Bolsonaro. As Igrejas permanecem abertas durante a quarentena, mas sem missas.

Os trabalhos de base continuam e as freiras católicas seguem na linha de frente: são muitas médicas, enfermeiras e assistentes sociais durante a pandemia. Essa cooperação vai desde a produção nos próprios conventos de máscaras para doação a investidas nas ruas e espaços religiosos, atendendo doentes e moradores/as de rua. Muitas religiosas, infelizmente, estão dando a vida pela resistência. Mais uma vez, essas mulheres são protagonistas políticas. 

Quer saber mais?
Acesse o artigo “Freiras na luta contra a ditadura no Brasil” para leitura mais aprofundada sobre este tema, disponível no livro resultante do Projeto Mulheres de Luta.

Ficha técnica:
Entrevista: Ana Maria Veiga e Jair Zandoná
Roteiro: Isa Maria Moreira Liz
Filmagem: Elaine Schmitt
Edição: Marina Moros

Acompanhe a websérie Mulheres de luta: feminismo e esquerdas no Brasil (1964-1985): 

Mulheres de luta: Trabalho, maternidade e domesticidade

Clique aqui para acessar o webdocumentário Mulheres de Luta completo.

*Isa Maria Moreira Liz é historiadora pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Atuou como Bolsista de Iniciação Científica/CNPq nos Projetos “Mulheres de luta: feminismo e esquerdas no Brasil (1964-1985)” e “Políticas da emoção e do gênero na resistência às ditaduras militares no Cone Sul”, com ênfase nas relações das freiras e da Igreja Católica à ditadura. Desenvolve pesquisa na área de historiografia católico-revisionista sobre a Inquisição Moderna e política do Vaticano.

Edição de Morgani Guzzo.

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