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A brasiliense Sarah Héricy, 24 anos, é a ilustradora feminista Sahr, autora dos famosos desenhos nas cores preto e branco de mulheres com cactos na cabeça. “Amar outra mulher é um ato revolucionário”; “Você é muito mais forte do que acredita ser”; e “Beleza não é um tamanho de roupa e muito menos uma cor” são apenas algumas das frases que complementam a arte da arquiteta e designer gráfica, que mora hoje em Buenos Aires, na Argentina. Ela não imaginava tamanha repercussão nem consegue medir o alcance de suas produções.

Com talento e espontaneidade, desenvolveu habilidade e gosto pela arte e conseguiu expor suas ideias e sentimentos, com os quais hoje pessoas se identificam e outras encontram referência. “Dos meus sete aos 11 anos passava quase todo o tempo livre copiando desenhos de uns cadernos de ilustração ukiyo (estilo artístico japonês) do meu tio. Foi ele quem me deu o primeiro escalímetro e então eu decidi que queria fazer isso para sempre: desenhar”, recorda.

Para Sahr, essa “interação do feminismo com a arte fará com que a história deixe de ser escrita por homens”. “Quando eu era pequena sempre me perguntava por que todos os pintores e ilustradores importantes eram homens? Por que só vemos duas artistas mulheres em três anos de visuais no ensino médio?”. Ela diz acreditar que “ser mulher é um ato político e ser feminista é tomar consciência disso e abraçar quem você é”. Em conversa com o Portal Catarinas, a ilustradora falou mais sobre seu trabalho, arte e empoderamento feminino.

Foto: arquivo pessoal
Foto: Elton Delgado

Catarinas: Como começou seu trabalho com viés feminista, de empoderamento feminino e de motivação? O que a levou a seguir essa linha?
Sahr: Acho que foi natural.

Eu sempre fui feminista mesmo antes de saber o que era o feminismo. Então, tudo que saia de mim tinha essa carga. Não foi uma decisão consciente, sabe? Eu acho que ser mulher e questionar as coisas que nos empurram é algo tão inevitável que, quando a gente olha para sociedade em que vivemos, isso vem naturalmente. Acho que o que acontece é que muitas de nós reprimimos isso justamente por ver o que acontece com quem levanta a voz. Eu, por sorte, tive muito apoio em casa e pude ver o feminismo assim, como uma consequência de ser mulher.

Catarinas: Desde quando você trabalha com a produção dessas ilustrações? E o que tem te inspirado para esse trabalho?
Sahr: Eu comecei pensando que ia ser uma série curta uns meses atrás e terminei percebendo que gosto muito de produzir assim. Antes eu fazia quadrinhos, mas me desencantei.

vivas

Catarinas: Qual é o processo de criação dessas ilustrações? Quais técnicas e materiais são utilizados?
Sahr: A todo tempo, eu costumo riscar cadernos e papel solto. Quando vejo algo que gosto, termino com nankin, digitalizo e trato no (programa Adobe) Illustrator. Mas a base é esta: qualquer papel e canetas de nankin.

Catarinas: Como você mede a audiência ou aceitação do seu trabalho nas redes e fora do universo digital?
Sahr: Não sou muito atenta a isso, pois me deixa nervosa acompanhar o caminho, já que solto o desenho na internet. Sou muito ansiosa e insegura. Essa combinação pode ser fatal quando você junta com a expectativa de aceitação. Quase sempre é um amigo que me diz quando algo foi compartilhado mais de mil vezes ou quando o número de followers aumentou. Evito olhar.

Catarinas: Quais pessoas são suas referências para esse trabalho?
Sahr: Acho que para as ilustrações em particular não tenho nenhuma referência visual. A inspiração vem mais do que eu estou lendo no momento, de algo que escrevi enquanto descarregava no caderno de notas, algo que escutei na rua ou senti vendo um filme.

Catarinas: O seu trabalho está bastante presente nas redes sociais. Como você vê esta forma de exposição/divulgação do seu trabalho? Em quais outros espaços o público pode acessá-lo?
Sahr: Eu acho maravilhosa essa possibilidade de alcançar tanta gente. Às vezes, me excede e me leva a uma crise de ansiedade, mas acho que no final é mais positivo que negativo. A parte negativa é o medo de como me interpretam ou de atrair coisas ruins. Eu costumo levar impressos a feiras de arte, mas só por aqui até agora. Estou buscando uma parceria no Brasil para isso. Mas por agora, em outros formatos, só aqui na Argentina mesmo.

Catarinas: Você tem tido retorno do público sobre o seu trabalho? Quais as reações e opiniões mais frequentes? E como você lida com as críticas?
Sahr: Eu não acompanho muito os comentários pela ansiedade, mas recebo algumas mensagens de pessoas agradecendo o incentivo e a força que sentem quando se identificam com algo que publiquei. É bem engraçado porque eu sinto que eu é que deveria estar fazendo os agradecimentos. Uma mensagem assim, às vezes, faz a diferença entre desistir e continuar produzindo. Desde que eu foquei nessas ilustrações, as críticas diminuíram bastante. As reações mais comuns costumam ser de identificação e depois disso pouca gente se anima a dizer algo. De negativas ainda tenho alguns perdidos que acham que mereço menos respeito por ser feminista, mas esses são cada vez menos.

Catarinas: Suas ilustrações costumam vir acompanhadas de mensagens. Quando você as cria, para quem está direcionando? E por quê?
Sahr: Acho que são coisas que eu digo para mim ou gostaria que alguém tivesse me dito no passado. Acho que podem servir para outras pessoas que passam ou sentem o mesmo que eu. Muitas são mantras que eu repito para mim mesma.

Catarinas: O que você espera causar nas pessoas com a sua arte?
Sahr: Antes eu só queria dividir e tirar de dentro algumas coisas. Hoje eu espero, de verdade, poder ajudar quem esteja lutando contra os mesmo fantasmas que eu a saltar algumas frases que não são necessárias e que eu não consegui saltar por me sentir sozinha e não ter ninguém com quem falar sobre essas coisas.

Catarinas: Como você o vê o diálogo dos artistas com os movimentos feministas?
Sahr: Casa vez mais mulheres estão usando a arte em todas as suas formas para expressar a importância da luta feminista e isso é lindo de ver. Quando eu era pequena sempre me perguntava por que todos os pintores e ilustradores importantes eram homens? Por que só vemos duas artistas mulheres em três anos de visuais no ensino médio? E hoje eu acho que estamos reclamando esse espaço e que graças a interação do feminismo com a arte, a história vai deixar de ser escrita por homens.

Catarinas: Além do trabalho como ilustradora, você participa de movimentos? Quais seus engajamentos?
Sahr: Eu participava de um coletivo e de um grupo que ajuda mulheres em situação de risco/rua, mas no último ano tive de me afastar de tudo e passar a me dedicar ao trabalho 24 horas. Isso me frustra bastante e gera uns momentos emocionais bem difíceis porque me sinto horrível não fazendo nada fisicamente com quem precisa. Mas viver de desenho é difícil e estou passando por umas dificuldades financeiras que me obrigam a isso. Como eu vou ajudar alguém sem poder pagar nem meu próprio aluguel? Eu espero poder voltar a fazer algo, mas preciso resolver essas coisas antes. Não dá pra se dedicar de verdade a outra pessoa quando você mesma está imersa em caos.

Catarinas: Como você comercializa sua arte?
Sahr: Eu vendo posters e stickers em feiras na Argentina para tentar pagar pelo menos o material. Também têm algumas camisetas, que são feitas por meio de uma parceria com a marca Sueka e estão à venda no site. Tenho vontade de produzir mais coisas, mas ainda não consegui uma maneira efetiva de manter os custos baixos e a produção limpa.

 

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