A primeira audiência pública que vai discutir a descriminalização aborto até a 12ª semana de gestação por livre vontade da mulher, no Supremo Tribunal Federal (STF), em 3 e 6 de agosto, terá mobilização nacional com o Festival pela Vida das Mulheres em Brasília e em várias cidades brasileiras. Caravanas chegarão à capital nacional para acompanhar de perto o debate sobre a ADPF 442 e apoiar a proposta .

Serão quatro dias de atividades. Em Brasília o evento ocorre no entorno do Museu Nacional, com transmissão direta, em telão, da audiência no Supremo, além de rodas de conversa, espaços de acolhimento, oficinas, shows. As mulheres reunidas no Festival seguem em direção ao STF na tarde da sexta, 3, e na segunda, 6, amanhecem no local. A programação completa do Festival em Brasília pode ser conferida aqui.

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Entende a ADPF. 

Segundo a Pesquisa Nacional do Aborto (2016), ao menos meio milhão de brasileiras realizam um aborto inseguro todos os anos – quase uma mulher por minuto. A criminalização força as mulheres, principalmente as negras e com piores condições socioeconômicas, a buscarem a clandestinidade ou mesmo a provocar a interrupção da gravidez sem nenhuma segurança ou orientação médica, com riscos de sofrerem mortes e sequelas que poderiam ser evitadas.

A  ADPF 442 reivindica a descriminalização do argumentando que a criminalização da interrupção voluntária da gestação fere princípios fundamentais da Constituição brasileira, como a dignidade da pessoa humana, a não discriminação e a igualdade. Participam da audiência pública 50 pessoas representando organizações da sociedade civil e campos acadêmicos de produção de conhecimento em saúde, direitos constitucional, direitos humanos e ciências sociais, que serão ouvidas em duas sessões.  

“Nossa participação na audiência pública e no Festival tem o sentido chamar atenção da sociedade brasileira para os efeitos da criminalização do aborto sobre a saúde e a vida das mulheres e ampliar o conhecimento sobre o direito ao aborto, legal, seguro e gratuito como um questão legítima de direitos humanos. Nossa presença também tem o sentido de denunciar a blindagem do tema no Congresso Nacional, que tem minimizado ou ignorado os graves efeitos sociais da criminalização e os indicadores sociais, legislando sobre a questão com base em preceitos morais e religiosos dogmáticos que não correspondem à realidade de vida das mulheres, que seguem interrompendo, com risco, gestações indesejadas, à revelia da lei”, argumenta Joluzia Batista, socióloga do Cfemea (Centro Feminista de Estudos e Assessoria).

Essa mobilização ampla também busca  deixar claro para o STF que uma parcela importante das mulheres brasileiras apoia o direito aborto como direito humano das mulheres. “Por muito tempo vivemos, enquanto mulheres, nesse lugar de silenciamento, de submissão às decisões feitas por homens. Hoje, percebemos a necessidade de romper este silenciamento e nos organizarmos, pois também queremos pautar as decisões. Isto é não só bonito como necessário”, afirma Camila Mantovani da Frente Evangélica pela Legalização do Aborto.

A audiência pública chamada pelo STF acontece num momento em que o debate sobre o direito ao aborto no mundo está aquecido. Desde 2006 houve reformas de leis que puniam o aborto em vários países vizinhos e de outros continentes: Colômbia (2006), Portugal (2007), Distrito Federal do México (2007), Espanha (2010), Uruguai (2012), Moçambique (2015), Chile (2017) e Bolívia (2017).  Em maio um referendum na Irlanda aprovou a eliminação do direito à vida desde a concepção do texto constitucional, abrindo caminho para ampla reforma de uma lei draconiana de restrição ao aborto. Em 14 de junho, na vizinha Argentina, após mais de uma década de persistente luta feminista pelo Aborto Legal, Seguro e Gratuito, a Câmara dos Deputados aprovou um projeto de lei que autoriza o aborto até a 14a semana de gestação. O texto está  em debate no Senado com votação prevista para o dia 8 de agosto.

Os eventos de debates dos próximos dias estão sendo mobilizados por grupos e movimentos que têm historicamente lutado pela descriminalização e legalização do aborto no Brasil e pela nova geração de ativistas que, desde 2015, tem tomado as ruas a redes sociais para conter regressões e clamar pela reforma da lei vigente. Os feminismos e movimentos de mulheres brasileiros sairão às ruas em diversas cidades do país. A programação dos eventos em Minas Gerais, Bahia, Pernambuco, São Paulo, Ceará, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Paraná, Rio de Janeiro e outras localidades está sendo reunida aqui.

“Tanto na Argentina quanto no Brasil a luta pelo direito ao aborto,  que tomou corpo no processo de redemocratização, hoje enfrenta, ainda que de maneiras distintas em cada país, enormes obstáculos criados por dinâmicas políticas de restauração conservadora. Pensando especificamente na mobilização deflagrada pela ADPF e a audiência pública que se anuncia, a trajetória da campanha argentina pelo Aborto Legal, Seguro e Gratuito é para nós uma fonte inequívoca de inspiração por sua tenacidade. Como disse Marta Alanis num encontro que tivemos na semana passada: ‘Em 2003,  definimos como objetivo legalizar o aborto na Argentina e apesar de conjunturas mais ou menos favoráveis, apesar de nossas diferenças, é isso que estamos fazendo”, explicou Sonia Corrêa do Observatório de Sexualidade e Política.

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